Economia
China retalia e aplica tarifas de até 15% sobre os EUA; oportunidade para o agro brasileiro?
Guerra comercial entre as duas maiores potências do mundo pode sinalizar vantagem às exportações brasileiras, principalmente, de grãos

Sabrina Nascimento | São Paulo
04/02/2025 - 09:26

Os mercados globais seguem nervosos nesta terça-feira, 04, após a China anunciar a aplicação de tarifas de até 15% sobre importações dos Estado Unidos (EUA). A decisão do governo chinês é uma retaliação a Donald Trump que, na última semana, impôs tarifas adicionais de 10% em todas as importações chinesas. A medida do governo norte-americano já está em vigor, enquanto a de Pequim começará a valer no dia 10 de fevereiro.
Segundo o Ministério das Finanças da China, petróleo bruto, equipamentos agrícolas e alguns automóveis dos EUA terão tarifas de 10%, já as taxas de 15% valerão para carvão e gás natural liquefeito.
O economista e professor do Insper, Roberto Dumas, destaca que a nova guerra comercial entre as duas maiores potências do mundo é uma repetição do que o mundo observou durante o primeiro mandato de Trump. Na ocasião, em 2018, à medida que o republicano aplicava tarifas sobre itens chineses, o governo de Xi Jinping respondia com a mesma reciprocidade. Como consequência, Pequim comprou menos grãos dos EUA, beneficiando o agro brasileiro.
“Então é importante que o agronegócio brasileiro esteja com o dedo no pulso para saber como é que vai ser essa guerra comercial para tentar aproveitar o máximo possível”, afirma Dumas. “O governo [brasileiro] tem que estar muito atento nas réplicas e nas tréplicas para aproveitar e, se por acaso, ocorrer essa guerra comercial e, se eventualmente houver uma tréplica, eles digam ao governo chinês ‘você, por favor, continue comprando do nosso agronegócio’”, acrescenta.
Tarifas contra México e Canadá estão suspensas
No último sábado, Donald Trump tinha anunciado a imposição de uma taxa de 25% sobre as importações de produtos do México e do Canadá, com exceção do petróleo, gás e eletricidade canadenses, que teriam taxa de 10%. Além disso, Trump também impôs uma tarifa de 10% sobre os produtos chineses.
Em resposta, o governo chinês tinha informado que entraria com uma representação na Organização Mundial do Comércio (OMC) contra a imposição das tarifas comerciais. Já os governos de Justin Trudeau, primeiro-ministro do Canadá, e de Claudia Sheinbaum, presidente do México, tinham se pronunciado prometendo reciprocidade, com taxas semelhantes. A retaliação mexeu com o mercado de commodities.
No caso dos grãos, como o México é o maior importador de milho dos EUA, as cotações do grão na bolsa de Chicago (CBOT) operaram boa parte da segunda-feira, 03, em queda, chegando ao menor nível em três semanas. A inversão desse movimento, no entanto, ocorreu no início da tarde, logo após o governo mexicano e norte-americano chegarem a um acordo para adiamento das tarifas em um mês. Horas depois, Trudeau informou que também fechou a mesma negociação de prorrogação, por 30 dias, com Trump.
Agro brasileiro acompanha movimento dos EUA e vê possíveis oportunidades
Para a Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG) a imposição de tarifas pelo governo dos EUA a outros países traz instabilidade ao mercado global, com possíveis reações. Porém, pode significar oportunidades para a exportação de produtos do agro brasileiro.
No caso da China, a entidade destaca que a oportunidade está na oferta de grãos, em especial soja e milho. Hoje, o país já é o principal comprador desses produtos do setor brasileiro.
Para o México, a vantagem está na exportação de carne suína, além de suco de laranja, assim como para o Canadá, que também poderia aumentar as compras de café brasileiro.
Porém, a Abag ressalta que ainda é preciso esperar as respostas comerciais destas nações à imposição de tarifas dos EUA para entender o que estaria reservado ao Brasil. Contudo, a entidade observa que o setor segue atento às movimentações no comércio mundial e espera que não haja imposição tarifária aos produtos agropecuários brasileiros.
Mercado agrícola
O adiamento das tarifas sobre produtos mexicanos levou à valorização das cotações. O vencimento do milho para março fechou em alta de 1,24%, a US$ 4,88 o bushel no pregão de segunda-feira, 03.
Segundo o consultor de Safras & Mercado, Paulo Molinari, a decisão trouxe um alívio temporário ao mercado, afastando o risco imediato de retaliação mexicana, que poderia impactar significativamente o comércio de milho e frango entre os dois países. “Em princípio, o efeito México está banido do mercado. Então, o mercado que estava baixando com medo de uma retaliação dos mexicanos, sem retaliação, voltou a subir”, destacou Molinari.
Nesta terça-feira, 04, os preços dos grãos na bolsa de Chicago operam praticamente estáveis. Por volta das 09h10, o vencimento da soja para março subia 0,01%, a US$ 10,58 o bushel. O mesmo contrato do milho tinha alta de 0,49%, a US$ 4,90 o bushel.
Óleos vegetais
Outro efeito do tarifaço foi observado no mercado de óleos vegetais. Como o Canadá é um grande exportador de óleo de canola para os Estados Unidos, a tarifa de 25% imposta por Trump encareceria este produto. Como efeito, os norte-americanos teriam de usar mais óleo de soja, enquanto o governo de Trudeau teria que vender para outros mercados.
No entanto, o excesso global de oferta limitou os ganhos. Com grandes volumes de óleo de palma disponíveis, além do aumento da produção de óleo de soja no Brasil e na Argentina, as cotações subiram em Chicago, mas os prêmios despencaram na América do Sul. “Para o Brasil, não adiantou nada”, pontuou o consultor de Safras & Mercado.
Fertilizantes
Outro setor que deve sentir os efeitos das tarifas de Donald Trump é o de fertilizantes, mais especificamente o mercado de potássio. O Canadá, maior produtor mundial de potássio, é responsável por suprir 80% do mercado norte-americano.
Em conversa com o Agro Estadão, o head de fertilizantes da StoneX, Marcelo Melo, explicou que os agricultores norte-americanos não têm o hábito de antecipar compras de fertilizantes. Entretanto, considerando a suspensão temporária da imposição das tarifas sobre o Canadá, os agricultores podem ir ao mercado para fechar negócios. Esse aumento da demanda poderia resultar em uma elevação de preços no curto prazo.
“Nos últimos dois, três meses nós tivemos fatores pontuais que fizeram com que o preço subisse cerca de 10%. E nos Estados Unidos, além disso, subiu mais 5% em janeiro. Mas são fatores pontuais que quando chegar em março, abril, maio, o mercado, possivelmente, vai voltar atrás, porque realmente está super ofertado”, disse Melo.
Para o Brasil, maior comprador mundial de potássio, o efeito direto sobre o mercado de fertilizantes deve ser limitado, uma vez que os agricultores fazem compras antecipadas. Somente no ano passado, foram importadas 14 milhões de toneladas de potássio.
No entanto, Melo ressalta que, se a demanda americana pelo fertilizante se concretizar de forma inesperada devido à tarifa, isso poderia gerar uma pressão adicional sobre os preços e afetar a dinâmica do mercado global, com uma possível alta de até 10% ou 15%.

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